Introdução
Um trecho do novo livro de Emanuele Coccia, Metamorfoses (Dantes, 2020):
Nascimentos
1. Como todas e todos, eu esqueci tudo. O gosto e o cheiro deste momento, as pessoas ao meu redor, os objetos que preenchiam este cômodo. Eu esqueci o dia e a hora, eu esqueci meus pensamentos e minhas emoções, eu esqueci a intensidade que a luz tinha nos primeiros instantes. Talvez esquecer fosse minha única opção? Tudo aparecia para mim pela primeira vez: tudo estava diferente demais, novo demais, intenso demais para que eu pudesse levar comigo. Eu tive que esquecer, e esquecer de tudo. Criar um vazio para abrir espaço ao resto: às coisas futuras, ao que se será em breve meu passado, ao mundo inteiro. Criar um vazio para tornar possível qualquer experiência. Eu tive que esquecer, e esquecer de tudo, para poder perceber a mim mesmo. O nascimento é o limite absoluto do reconhecimento.
Ano
— 2020